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segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Uma hora e 10 minutos

Houve uma hora e 10 minutos, apenas uma hora e 10 minutos em um século inteiro, em que os colorados festejaram um sucesso do Grêmio. Passaram-se, esses 70 inéditos minutos, das 17h25min às 18h35min deste domingo, 6 de dezembro de 2009. Numa história de cem anos e 138 dias, que é a idade da rivalidade Gre-Nal, seria de se esperar que nada de novo acontecesse.

Aconteceu.

Aos 21 minutos do jogo do Maracanã, Douglas Costa cobrou escanteio da direita e o atacante Roberson se antecipou aos zagueiros, marcando 1 a 0 para o Grêmio e emudecendo os 84 mil flamenguistas ombreados nas arquibancadas do maior estádio do mundo. No Beira-Rio, a 1.553 quilômetros de distância, 32 mil colorados vibraram.

Sessenta segundos depois, na mesma marca de 21 minutos, Alecsandro fez o primeiro gol do Inter contra o Santo André. No Rio, a pequena torcida do Grêmio se lamentou tanto quanto se lamentou a grande massa do Flamengo.

Os resultados combinados davam ao Inter o título de campeão brasileiro.

No gramado do Maracanã, nada indicava que essa situação poderia mudar. O time misto que o Grêmio mandou a campo jogava bem, dominava o Flamengo, tocava a bola, era insinuante. Atrás, Mário Fernandes deixava evidente porque já é um dos melhores zagueiros do Brasil, apesar de ainda mostrar no rosto as cicatrizes das acnes de seus 19 anos. No meio, outro jovem talento, Maylson, combatia como se disputasse um título, deslocava-se, protegia a zaga, projetava-se para o ataque. Mais adiantado, Douglas Costa, ardiloso, esguio, agudo, tirava a drible o fôlego de zagueiros e torcedores do Flamengo.

Esses os destaques, mas todo o Grêmio atuou com galhardia. Marcelo Grohe praticou defesas impensáveis, Thiego foi sempre sério e concentrado, Leo foi um duríssimo marcador de Adriano, Adilson correu o tempo inteiro, e Roberson estava sempre ameaçando a defesa adversária.

Nem o gol de empate do Flamengo, autoria de David, aos 29 minutos, diminuiu a sensação de que, graças ao Grêmio, o Inter poderia, sim, ser campeão. Até porque, no Beira-Rio, Índio consolidava a vitória colorada marcando 2 a 0. Sete minutos depois deste gol, Mário Fernandes fez mais um para o Grêmio, mas o árbitro assinalou impedimento. O Grêmio seguiu atacando e, ao 43, Douglas Costa por pouco não ampliou.

Os quatro times, Grêmio, Inter, Flamengo e Santo André, desceram para os seus vestiários às 17h51min. Os mais de 110 mil torcedores nos dois estádios sabiam que, no quarto de hora que se seguiria, o Inter continuaria líder na tabela, virtual campeão. Quando a bola voltou a rolar, a esperança colorada prosseguiu em alta: aos dois minutos, Douglas Costa cobrou uma falta com perigo, quase gol, o Beira-Rio gemeu.

O Flamengo pressionava, mas o Grêmio se defendia com competência. As emissoras de TV exibiam imagens dos rostos tensos dos torcedores no Maracanã. A partida do Inter já ia pela metade, e Andrezinho marcou de falta os 3 a 0, aos 22 minutos. Todos no Beira-Rio só se interessavam pela partida do Maracanã. Os narradores das rádios contaram que Marcelo Grohe praticou uma defesa de Eurico Lara, de Mazaropi, de Danrlei, de Victor aos pés de Adriano, e os colorados aplaudiram. O Grêmio saiu para o ataque, mas o Flamengo retomou a bola.

Escanteio.

Na cobrança, Ronaldo Angelim estabeleceu, de cabeça, os 2 a 1.

O Maracanã uivou de alegria.

No Beira-Rio, colorados levavam as mãos à cabeça. Depois de um minuto de silêncio, voltaram a cantar e a incentivar o time, só que sem o mesmo entusiasmo daquela hora e 10 que havia se passado.

A noite começava a cair sobre Porto Alegre. No Rio, os flamenguistas ainda se angustiavam. O Grêmio não desistia. Atacava. Maylson perdeu um gol da pequena área, Douglas Costa entrou a drible na área e a bola lhe foi roubada no último momento, Marcelo Grohe impediu outro gol de Adriano.

Giuliano fechou o quarto gol, Nunes descontou de pênalti, mas o jogo de Porto Alegre não interessava mais. Nada interessava mais.

Encerradas ambas as partidas, o Inter festejou a classificação para a Libertadores, o Flamengo festejou o título e o Grêmio festejou a atuação digna num domingo cheio de perigos. Nas ruas da capital dos gaúchos, alguns motoristas faziam soar as buzinas de seus carros, rojões espocavam ao longe. Eram gremistas? Eram colorados?

Pela primeira vez, em cem anos, foi impossível de saber.



Texto de David Coimbra publicado em Zero Hora no dia 7/12/2009

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